Monteiro
Lobato - As obras de Monteiro Lobato para crianças marcam o início da
literatura infanto-juvenil em prosa no Brasil. Em 1921, ele lança o primeiro
livro da série do Sítio do Pica-Pau Amarelo, A Menina do Narizinho Arrebitado.
A obra conta a história de uma garota que vive no sítio de sua avó, Dona Benta,
e que se diverte com seu primo Pedrinho e seus brinquedos favoritos: um sabugo
que fala, batizado de Visconde de Sabugosa, e uma boneca de pano chamada
Emília, que aprende a falar graças às pílulas do Dr. Caramujo. Eles vivem as
aventuras no Reino das Águas Claras, no qual Narizinho se casa com o Príncipe
Escamado. Essa história é o início também da criação de um imaginário
brasileiro na literatura e de uma nova noção de criança: questionadora, ativa e
atuante enquanto ser social e político. O livro, em formato diferenciado,
apresenta o texto acompanhado de ilustrações, enfatizando a função da imagem
nos livros infantis, tendência então desconhecida no Brasil, proposta pela Nova
Escola de pedagogia européia. Lobato, no decorrer de sua obra, mostrou-se
preocupado em cunhar uma linguagem própria para a literatura infanto-juvenil
brasileira, incluindo coloquialismos, neologismos e gírias. Deste modo, ele
reveste de ritmo e originalidade os diálogos das personagens e a fala do
narrador. Neste momento, Lobato constata: "Estou condenado a ser o
Andersen desta terra". Ele escreve e reescreve sua obra literária infantil
entre 1921 e 1942, ano em que encerra o processo, publicando suas obras completas,
conforme o arranjo que conhecemos atualmente. Sua produção de literatura
infantil é reflexo da tendência da infanto-juvenil: de caráter misto entre
realismo e imaginação fantasiosa, porque mescla literatura com aprendizagem. Na
concepção da época, as obras de Lobato eram lidas por crianças. Hoje, algumas
delas são consideradas para adolescentes, como Os Doze Trabalhos de Hércules, O
Minotauro, Hans Staden e Dom Quixote das Crianças. Inclui-se nesse rol as
adaptações de Robinson Crusoé e Robin Hood. Uma vertente que dialoga com o
passado é a retomada que faz dos contos folclóricos e fábulas em O Saci,
Histórias da Tia Nastácia, O Sítio do Picapau Amarelo e Fábulas. E a adaptação
que faz dos contos de Grimm, Andersen e de Caroll. Em 1942, o educador Lourenço
Filho apresentou um balanço sobre a literatura infantil à venda naquele momento
no Brasil. Constatou 605 trabalhos publicados, sendo 434 traduções, adaptações
e mesmo grosseiras imitações; no total, 171 são obras originais de autores
brasileiros. Lobato se encontra entre uma dezena de nomes que se dedicam às
crianças junto a Francisco Marins, Malba Tahan e Viriato Correa. As décadas de
1950 e 1960 apresentam poucos grandes nomes que souberam manter a originalidade
de Lobato, como as obras infantis de Erico Verissimo, Lucia Machado de Almeida,
Vicente Guimarães e Orígenes Lessa. Eles se caracterizam por terem, com maior
ou menor intensidade, realizado obras em que o imaginário e o lúdico encontram
uma linguagem adequada para expressar-se, abordando temas históricos, ou de
inspiração folclórica ou ainda criando aventuras originais.
A revista
Recreio - A revista Recreio, publicada pela Editora Abril, foi a primeira e
única revista infantil semanal dos anos 1970 produzida no país. A revista
mantinha uma proposta literária e lúdica com um formato diferenciado. Cada
número era dedicado a um tema de interesse do universo infantil, como o
Zoológico e o Circo nos dois primeiros números. As brincadeiras de cortar e
colar seguem a temática da história proposta. A revista foi coordenada por
Sônia Robatto nos primeiros dez anos, quando apresentou novos nomes da
literatura infantil como Ana Maria Machado, Ruth Rocha e Joel Rufino dos
Santos. Seus mais constantes ilustradores foram Canini, Waldyr Igayara, Izomar,
Brasílio e César Sandoval. Nos dez anos seguintes, Ruth Rocha coordena a
revista, que recebe um novo formato, inserindo em cada exemplar uma história
ilustrada longa, reportagens, histórias em quadrinhos e brincadeiras. Nessa
fase encontramos histórias com texto de Sylvia Orthof, Ana Maria Machado, Joel
Rufino dos Santos, Walcir Carrasco e Rogério Borges, narrativas visuais de
Otávio, César Sandoval e Rogério Borges. E todas as histórias receberam e
ilustrações de Walter Ono, Rogério Borges, Cláudia Scatamacchia, José Carlos de
Brito, Adalberto Carnavaca, Alcy Linnares e Helena Alexandrino. Muitas das
histórias publicadas nessa fase vieram a ser publicadas em livros infantis de
grande sucesso mais tarde, como Marcelo, Marmelo, Martelo, de Ruth Rocha,
Camilo, o Comilão, de Ana Maria Machado, Joaquim e a Mesa de Botequim, de
Sylvia Orthof, e Marinho, o Marinheiro, de Joel Rufino dos Santos. Recreio foi,
portanto, a primeira publicação a registrar e a difundir para grande número de
leitores o trabalho desses novos escritores que promoveram uma renovação nos
textos de literatura infantil. Deu oportunidade a artistas para atuar como
ilustradores, que, mais tarde, se tornaram os grandes nomes dos livros
infantis, como Walter Ono, Helena Alexandrino, Cláudia Scatamacchia, José
Carlos de Brito e Rogério Borges.
Ruth Rocha
A
diversidade de temas - Na década de 1980, novos autores se fazem presentes:
Sylvia Orthof, que questiona papéis e valores sociais na sátira Mudanças no
Galinheiro Mudam as Coisas por Inteiro e Uxa, Ora Fada, Ora Bruxa; Eva Furnari,
criadora da personagem Bruxinha, que também se dedicou à narrativa visual nos
livros Zuza e Arquimedes e Amendoim, gênero em que também se destaca Ângela
Lago, autora de, entre outros, Chiquita Bacana. Tatiana Belinky apresenta
histórias de humor, como Medroso, Medroso e A Operação do Tio Onofre, além de
traduzir as coleções de poemas Di-versos Russos e Di-versos Hebraicos. Ricardo
Azevedo, por sua vez, elege a literatura urbana em Um Homem no Sótão, e
temática contestatória, em Nossa Rua Tem um Problema. Ciça Fittipaldi volta-se
para as questões da cultura brasileira, com a Série Morená, coleção de
histórias que trabalha a riqueza da linguagem indígena. A questão ecológica
suscita algumas boas publicações, como a Coleção Acorda Bicho Homem, com textos
de Luiz Galdino e Carlos Queiroz Telles. Rogério Andrade Barbosa dedica-se ao
registro das fábulas africanas em Bichos da África e Contos ao Redor da
Fogueira. A ficção científica fica por conta de Os Viajantes de Gleb e Tudo É
Semente, de Rubens Matuck. A obra imaginativa fica por conta de Maria Heloisa
Penteado em No Reino Perdido do Beleléu.
Anos 1990:
tempo de recessão – O crescimento do número de obras estrangeiras traduzidas
não impediu o aparecimento de novos autores, como Roger Mello, autor de Maria
Teresa e Cavalhadas de Pirenópolis, em que recorre à arte popular para fazer
uma leitura contemporânea de elementos perdidos da nossa identidade. Graça Lima
dedica-se ao campo da narrativa visual, com Noite de Cão e Só Tenho Olhos pra
Você, assim como Nelson Cruz em Leonardo e Noé. Leo Cunha volta-se à poesia em
Cantigamente e Clave de Lua, e Celso Sisto à prosa intimista em O Beijo do Sol
e Ver de Ver Meu Pai. A questão ecológica é abordada por Ângelo Machado na
coleção Que Bicho Será? e por Bia Hetzel em Mati e Rita, a Orça e a Caiçara.
Anos 2000 –
As obras traduzidas continuam tendo grande destaque nas estantes de literatura
infantil das livrarias, assim como as versões impressas dos desenhos animados
da Disney. Os grandes autores, no entanto, como Ana Maria Machado, Ziraldo,
Ruth Rocha e Ângela Lago, entre outros, continuam produzindo. Aparecem algumas
revelações, como Arthur Nestróvski, crítico e professor de literatura, vencedor
do prêmio Jabuti de 2003 na categoria de melhor livro de ficção, com um livro
de literatura infantil: Bichos Que Existem e Bichos Que Não Existem. Reginaldo
Prandi, sociólogo e pesquisador da cultura afro-brasileira, também é uma das
revelações, ao contar histórias iorubas para o público infantil em Ifá, o
Adivinho. Além deles, Odilon Moraes, outro escritor novato, publica A
Princesinha Medrosa, que ganha prêmio de melhor ilustração (do próprio Odilon)
e melhor livro para criança, da Fundação Nacional do Livro Infantil e Juvenil,
prêmio que divide com Bia Hetzel, por O Dono da Verdade. Roger Mello escreve
Meninos do Mangue e é premiado com o Jabuti de 2002 e Nelson Cruz produz Chica
e João, ganhador do Jabuti de 2001. Rogério de Andrade Barbosa entra na lista
de honra do IBBY de 2002, com Duula, A Mulher Canibal – Um Conto Africano. Para
as crianças muito pequenas, o destaque é para o casal Mary e Eliardo França.
A literatura
juvenil - Temas como identidade, aventura, suspense, romance, histórias de capa
e espada, mistério, biografia, conflitos familiares e diário sempre foram de
interesse do público adolescente, antes mesmo de ele ser nomeado como um
público específico. Somente após a II Guerra Mundial, a juventude passou
gradativamente a ser foco de atenção. A contracultura dos anos 1960 acentuou
muito essa tendência. Hoje em dia ser jovem é algo a ser preservado e valorizado.
E a mídia descobriu os jovens enquanto consumidores. Baseados nesse novo
conceito, a literatura também estabelece um nicho no mercado, intitulando-o
Literatura Juvenil. O adolescente que vive um período de autodefinição, de
busca de identidade e do delineamento da personalidade procura nos livros e no
mundo respostas às suas indagações. Entretanto, até os anos 1950, a leitura dos
jovens era pautada por eles mesmos, quando elegiam autores que trabalhavam
temas sociais, aventura, suspense, romance, mistério e terror, dedicando-se à
leitura das obras de Charles Dickens, Jack London, Karl May, Jules Verne,
Robert Louis Stevenson, J. D. Salinger, Hemingway, Kafka, Mary Shelley e
outros. E incluindo entre as leituras, autores brasileiros, como Lobato, Malba
Tahan, José Lins do Rego, Viriato Correia, Lucia Machado de Almeida, Francisco
Marins, Fernando Sabino, Jorge Amado e Maria José Dupré.
A década de
1970 proporciona um aumento de publicações dirigidas aos adolescentes. As
editoras relançam autores clássicos, estrangeiros e brasileiros, e novos
autores, como João Carlos Marinho, com a Turma do Gordo, que aborda temas
polêmicos até os anos 1990, e Edy Lima, com a série da Vaca Voadora. Ambos
abordam o humor de forma inteligente e divertida. Outro escritor que une humor
e imaginação é Orígenes Lessa. Marcos Rey, Stella Carr Ribeiro, Luis Galdino,
Odette de Barros Mott e Ganymédes José preferem a temática da aventura e do
mistério, que garante grandes tiragens. Destacam-se no romance mais intimista,
que trata da adolescência feminina, Giselda Laporta Nicodélis e
Antonieta Dias de Morais. Por sua vez, José Mauro de Vasconcellos responde pelo
romance dramático, com Meu Pé de Laranja Lima, entre outros.
A literatura
para os adolescentes – Na década de 1980, produz-se grande quantidade de obras
do gênero "diário íntimo", enfocando diversos aspectos da vida dos
adolescentes. Investem nessa linha os escritores Álvaro Cardoso Gomes, Luiz
Antonio Aguiar, Ruth Rocha, Ana Maria Machado, Ronald Claver, Vivina de Assis
Viana e Sylvia Orthof. Essa é, porém, a fase da diversidade de temas, estilos e
abordagens. Dedicam-se a essa diversidade autores de grande imaginação, como
Lygia Bojunga Nunes, Eliane Ganem, Marina Colasanti, Lino de Albergaria, Mirna
Pinsky, Leila Reintróia Ianonne e Liliana Iacocca. Nessa década ainda são
publicados romances de denúncia social, com
destaque
para autores como Sérgio Caparelli, Charles Kiefer e Sonia Rodrigues Motta.
Destaca-se ainda a narrativa de questionamento da cultura indígena na América
Latina, como propõe Ana Maria Machado, em De Olho nas Penas, que recebeu o
Prêmio Casa de Las Américas em, 1980.
Temáticas
urbanas - Nos anos 1990, os romances de temática urbana apresentam o ponto de
vista do adolescente diante das mudanças de seu papel social e do próprio
ambiente urbano. Ricardo Azevedo, Marcelo Carneiro da Cunha e Toni Brandão
voltam-se a essas questões. Há os romances intimistas, que tratam de conflitos
emocionais sérios, de que são exemplo as obras de Ana Maria Machado, como Bisa
Bia Bisa Bel, Bartolomeu Campos Queirós, como Em Nome do Pai, e Lygia Bojunga
Nunes, em Tchau. Há romances que inserem a nova concepção de mulher, família e
relacionamento, como faz Sylvia Orthof em obras como O Livro que Ninguém Vai
Ler, Vera Dias em Ninguém Tira Esse Sorriso de Mim, Fanny Abramovith, em Roda
Mundo; e os de problematização política e social, exemplificados pela obra de
Renato Tapajós, Os Carapintadas, e pela Coleção As Aventuras de Ivo Cotoxó, de
Paulo Rangel. A prosa detetivesca cresce em qualidade literária com o trabalho
de Paulo Rangel, em Assassinato do Conto Policial. A fertilidade da literatura
infanto-juvenil brasileira e a qualidade dos livros e autores ficaram
testemunhadas e comprovadas com o galardão conferido a Ana Maria Machado,
contemplada, em 2000, com o Prêmio Hans Christian Andersen pelo conjunto de sua
obra.
Anos 2000 -
Os fenômenos Harry Potter e Artemis Fowl roubam a cena da literatura
infanto-juvenil. A exibição da trilogia de O Senhor dos Anéis no cinema também
voltou a despertar interesse sobre o livro de J.R.R.Tolkien, que ganhou novas
edições. Uma marca do período é a estréia de escritores já conceituados se
voltando para o público juvenil, como Luis Fernando Verissimo, com O Santinho,
José Roberto Torero, com Uma História de Futebol, e Carlos Heitor Cony,
adaptando Alexandre Dumas em O Máscara de Ferro. Têm destaque, ainda, novos
escritores, como Adriana Falcão, autora de Luna Clara e Apolo Onze, que dividiu
o prêmio de melhor livro para jovens da Fundação Nacional
do Livro
Infantil e Juvenil com Fernando Vaz, autor de Mohamed: Um Menino Afegão. Além
deles, Joel Rufino dos Santos é muito bem avaliado por Quando Eu Voltei, Tive
uma Surpresa. Fábulas do Amor Distante, de Marco Túlio Costa, e Contos de
Enganar a Morte, de Ricardo Azevedo, conquistam os primeiros lugares do Jabuti
de 2004.
Fonte: ALMAMANQUE
ABRIL - 2005. São Paulo: Editora Abril, 2005.
Fonte Imagem na ordem sequencial da apresentação:
(01) -
(02)
http://revistaescola.abril.com.br/lingua-portuguesa/pratica-pedagogica/leitura-nao-pode-ser-so-folia-423575.shtml
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